Uma mulher de palavra IV.

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A literatura é multiplicação da vida. Somos o mundo inteiro no pequeno espaço da história que nos permitimos criar. Escrever é emprestar o corpo ao corpo que desconhecemos. É emprestar pernas aos inválidos. É colocar olhos no cego. É dar voz a boca que é muda, até incorporar o conflito que não nos pertence. É desvelar o conceito, o sentido mais oculto, o desconcerto que nos cora a face. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.59).


Bilhetes e retalhos III.

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A sombra deste abacateiro é tão velha quanto eu. Dizem que foi plantado pelo meu bisavô, por ocasião da partida de seu filho, que foi ser padre no outro lado do mundo. Plantou a árvore para substituir a presença que se foi. Quis ver  nascer da terra alguma coisa que pudesse acalentar a ausência.
Depois de tanto tempo já passado, filho morto e pai sepultado, a velha árvore continua sendo uma resposta à dor sentida. Estende no tempo a partida que já não há. Prolonga na história  o que o silêncio se encarregou de sepultar e se transforma em sacramento na memória de quem sabe o motivo. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p. 47).


Uma mulher de palavra III.

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A mulher na esquina, da padaria, na travessia da avenida. O hormônio da sensibilidade mistura-se à fumaça e ao barulho dos carros. A vida fica mais leve.  Os seios, os úteros, os ovários. A vida segredando seus primeiros movimentos  nesses corpos que andam. As barrigas que crescem; a maturidade que chega. O leite que escorre;  o prazer que agora tem outro nome, outro toque, outro molde. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.61).

Troco Imóvel

Amor que amansa II.

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A comadre Efigênia, por sua vez, não se dobrou aos ditames do machismo. Sem alterar a voz, fazer passeatas ou  queimar sutiãs nas praças, ela foi transformado aos poucos o gênio difícil do marido que a vida lhe deu. Foi dama. Com fala mansa, olhar cuidadoso, soube investigar a alma de Amâncio tal qual o terapeuta investiga seu paciente. Teceu outro homem. Tal qual tecelã, entrelaçou  novas cores no homem opaco que tinha ao seu lado. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.40).


Uma mulher de palavra II.

Só os corajosos esquecem. Eu Esqueci. E por isso amei. Vivi a vida ao contrário. Desenvolvi a técnica de vencer ondas  revoltas e ainda ganhar tempo para observar sua beleza. Andei em circulos, ritualizei as retas para que as distâncias não me desconcertassem. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.58).


A mulher e a velhice II.

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A velhice multiplica as inseguranças. Os comprimidos também. Osteoporose é um gato de estimação que todo velho tem. Fica sentado beirando as pernas, nos mastigando aos poucos. Eu me sinto um retrós de linha sendo puxado  pela vida. Fio de lã que vai se desprendendo do novelo, caindo aos poucos, desenrolando-se e se perdendo pela sala.  (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.103).

Troco Imóvel

A vida requer leveza.🙌

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Eu ando sorrindo pra vida, desapegando de tudo que não me faz bem. (Roni Alves)


A mulher e a velhice I.

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Não queria ser novelo. Queria ser novela! As mulheres das novelas não envelhecem. Brincam de ser mulheres de maridos, mas não são. Apagam-se as luzes do set e estão solteiras de novo. Eu não queria ser a atriz. Essa também tem marido! Eu queria ser a personagem, aquela que morre com o apagar da luz e que volta à cena quando querem os autores. Eu me escreveria. Fina, má e determinada. Mas só de vez em quando. Por vezes eu seria santa e abnegada: solitária convicta. Castidade criativa. Quereria o instante de cada felicidade, e nele poria minha demora. O deleite sem pressa, sem feijão precisando da panela de pressão para que não seque. A vida de pintura, unhas vermelhas, cabelos laqueados e armados como se fosse um circo. Eu, feita de luzes e aplausos. A expressão sem marcas, sem rugas nos cantos da cara. O sorriso livre de cáries indesejadas. A personagem sempre linda, pronta para uma atuação perfeita. A voz determinada expulsando o marido da sala como se fosse um cão que precisa aprender a obedecer . - Sai daqui! - O grito forte, quase  igual ao de Dom Pedro às margens do Ipiranga, proclamando a independência do Brasil. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.103,104).


A justiceira III.

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Ninguém confirma o fato, mas comenta-se a boca miúda que vovô  Germano teve um envolvimento com uma messalina durante toda a sua vida.
Vovó Anita nunca tocou no assunto, mas nos seus últimos anos de vida, quando a esclerose já havia lhe roubado a lucidez, vez ou outra esbravejava uma mesma  frase, recheada de ódio e ressentimento. Colocando ranhuras de ódio na voz, ela dizia: "Lady Cláudia, sua vaca, vai roubar o marido de outra, sua sem-vergonha!". (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.137).

Troco Imóvel

Os amores e suas incongruências I.

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Ando preferindo a solidão da minha sala de estar. Nela há mistérios que o tempo me ajuda a recolher.  Eles se escondem por todos os cantos. Ficam impregnados nas realidades materiais e emprestam eternidade ao temporário, ao transitório. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.88).


Bilhetes e retalhos II.

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O amor sobrevive de memórias. Essa verdade me acompanha desde menina, quando minha mãe me ensinou o ofício de tecer colchas de retalhos. Fazia questão de contar a história de cada retalho que pegava na mão. Frases curtas mas com significados profundos, não sei ao certo se havia algo de verdade em seus contos, mas isso não importa. Verdadeiras ou não, aquelas histórias me emprestavam alegrias. 
Uma colcha de retalhos guarda histórias surpreendentes. Eu aprendi. Olho para a trama da colcha e concluo:" O retalho de veludo marinho não ficou bem neste losango, onde predomina o percal e suas tonalidades apagadas, Parece um lorde inglês perdido em festa de pobre!". (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.47 e 48).
           

A Justicira III.

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Tivesse eu destreza para montar cavalos sairia fazendo justiça no mundo com as próprias mãos. No fio de minha espada, eu passaria a fidelidade conjugal a limpo. Cortaria os pescoços contornados de colares e perfuraria  os peitos cheios de decotes. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.139).
           
Troco Imóvel

A justiceira II.

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Eleonora Mendonça também presenciou a cena. Sua pessoa contabiliza o valor de vinte. Língua ferina. Não é à toa que tem apelido de Rádio Municipal. Dá notícia de tudo e ainda faz intervalos de propaganda. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.136).
           

A sacerdotisa.

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Minha catequese é concreta. Não lavo palavras. Alvejo as sujeiras do mundo a partir do meu tanque. É aqui que dou um jeito nas imperfeições que o diabo inventa. Comigo ele não pode. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.168).


A lei do amor II.

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Não posso negar. Estou vivendo na pândega alimentar. Não estou nem aí para os conselhos do doutor Gilliard. Outro dia ele quis gritar comigo, dizendo que, se eu não controlar minha alimentação, terei um infarto fulminante. Em breve, salientou. Disse que minhas artérias estão todas entupidas. Olhei pra ele e cinicamente cantei: - Aquela nuvem que passa lá em cima sou eu. Aquele barco que vai mar afora sou eu.-  Ele quase me matou com o olhar marejado de ódio. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.171).
           

Amor inacabado III.

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Lourival é meu jardim. Descobri isso quando me recordei do empenho que minha mãe tinha com suas sementeiras. Todas as sementes eram jogadas num mesmo vão de terra. Algumas floresciam. Outras não.
Ao semeador não cabe perguntas. Semear é seu ofício. A terra resguarda o segredo que ele tanto deseja saber. O jeito  é esperar para ver o resultado. O tempo da espera é o tempo da fé. Tempo em que os olhos, de vez em quando, se  lançam na direção do silêncio da terra para investigar se há vestígio de broto. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.161).

           

Cheia de graça I.

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Ediolinda só tem tempo para ser feliz, não desperdiça em outros caminhos. Parece absorta em constante satisfação. A cara larga e morena é o território onde intuímos tudo isso. Os olhos redondos, bonitos cheios de viço, anunciam que naquele corpo a vida é bem-vinda. A boca que vive cheia de cantos nunca se entregou ao poder de falas pessimistas. A qualquer hora do dia ou da noite, uma boa noticia pode ser cantada, porque  no coração de Ediolinda há sempre uma esperança sendo gestada. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.188).
           
Troco Imóvel

A mulher e o tempo II.

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A consciência de que a vida está passando pode nos sufocar. O aprendizado já é velho dentro de mim. Nasci à beira de um rio imenso. Minhas lembranças são interessantes e ensinam. Meu tempo estava diretamente ligado ao movimento do rio. Eu o via de longe. Gostava de percebê-lo lento, como se estivesse estacionado para esperar por mim. Passava horas e horas em estado de contemplação. Sempre que podia, eu me aproximava. Gostava do medo que ele me causava. Temia aquele volume imenso de águas. Minha estrutura era pequena demais para tanta grandeza. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.123).
           

A compulsiva II.

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Sinto um arrepio na espinha toda vez que escuto a expressão "queima de estoque". Costumam ser maravilhosas.  Os preços caem vertiginosamente. Eu me antecipo. Gosto de ser a primeira a me plantar na porta da loja. Há muita coisa que sai praticamente de graça.
Outro dia peguei uma situação dessas num mercado de utilidades domésticas. Não havia nada de que eu realmente precisasse, mas fiz um grande estoque de presentes. É sempre bom ter uma coisinha em casa, caso surja uma situação que não nos permita uma saída rápida para comprar um presentinho. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.23,24)

           
Troco Imóvel


Girassol.🌻

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Hoje sou feito girassol não posso ver uma fresta de felicidade, que sigo na direção.
           

Alma em desordem II.

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Homero chegou em minha vida numa tarde triste de inverno. O frio da paisagem sugeria aconchego de braços, presença de homem que me fizesse esquecer os tempos idos de solidão e mágoa. 
Chegou à cidade para gerenciar a construção da praça da matriz. Instalou-se na pensão de minha mãe e, no mesmo ritmo com que fazia seguir a praça do meio das pedras e monturos, fez surgir em mim a certeza de que o amor é capaz de nos fazer nascer de novo. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p. 180).

           
Troco Imóvel

Amor inacabado II.

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Minhas ausências não me deixam partir. Funcionam como âncoras que me prendem ao porto. Não tenho coragem de encher os pulmões de ar para formular  o meu grito de independência. Diga ao Lourenço que fico. Diga a ele que que sempre ficarei. Eu não saberia buscar outro lugar sem que seus olhos proprietários me acompanhassem. Ele é meu complemento. Disso não tenho dúvida. Parece cruel, mas não é. É nele que avisto a parte que falta. Sou de pedra. Serei sempre de pedra. Demoro para crescer, eu sei, mas ninguém poderá negar que toda pedra inspira segurança. A Sagrada Escritura nos sugere  que a casa precisa ser construída sobre a pedra. Não há chuva ou tempestade que possa separá-la de seus alicerces. Simão foi transformado em pedra. O homem que foi retirado das águas se tornou porto inicial. Sobre águas ninguém está seguro. Sobre a pedra, sim. Pois bem. Esta é a minha regra. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.162).
           

Bilhetes e retalhos II.

Enquanto isso, vou cuidando desta avenca na janela como quem cuida de um recém-nascido. Mas ela não agradece. Vive murcha. Nunca tive sorte com avencas. Quem me deu esta muda foi minha prima. Heliodora. Trouxe pra mim de Santo Antônio do Monte. Eu a encontrei na mesinha de centro da minha sala . Uma surpresa. Tinha atado em seu caule um bilhetinho com dizer único: "Cuida direitinho, senão morre!". A comadre tem razão. Há tanta coisa na vida que, se a gente não cuida direitinho, acaba morrendo antes da hora. A Odete Leocádia é um exemplo disso. Está morrendo antes do tempo. Foi vitima de um bilhete de geladeira. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.50).
           

Do nome infeliz à infelicidade do nome.

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O bom mesmo é possuir um nome que sobreviva a todas as fases da vida. Laura, por exemplo. Laura criança. Laura moça e Laura velhinha. Laura é um nome que parece abarcar a vida inteira, Não é resumo de um tempo. A Laurinha menina, vestidinha de saias rodadas, sapatos de verniz e laço na cabeça, será no futuro a respeitosa dona Laura, professora aposentada que usará óculos e terá a pele vincada pelo tempo. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.154).

Troco Imóvel

Da vida, alheia I.

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Eurípedes não desiste de esperar por Hélio Roncastro. Pobrezinha. Parece que o coração ficou estacionado naquela tarde chuvosa de dezembro. O tempo passou, mas ela ainda continua presa na memória dos trilhos .(MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.145).
           

A justiceira I.

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Bancou a amiga, comeu no mesmo prato, criou intimidade. Ora uma xícara de açúcar emprestada pra terminar de coar um café, ora uma medida de arroz para completar o almoço, e depois o pulo da naja. Quando Joelma chegou, seus olhos não podiam acreditar no que viam. A indecente estava deitada  na sua cama, nos lençóis que engomara, e pior: com o seu marido. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.135).

             

☀🙌

           
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Os dias se tornam bem mais leves a partir do momento que
carregamos simplicidade em todos os nossos gestos. 
           
Troco Imóvel

Bilhetes e retalhos I.

           
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O bom da vida está por toda parte. Os retalhos que costuro me recordam que a felicidade é um mosaico. O cotidiano me empresta os pedaços que compõem o todo.Cada instante de vida é como um retalho que ajunto pela força da sutura.(MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.48).
           

Amor profilático II.

           
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As miudezas esparramadas pelos cantos de minhas lembranças me conduzem ao altar de minhas predileções. A memória é o campo do amor preservado. É nela que a autoridade do discurso humano encontra a raiz mais sustentadora. (MELO, Pe. Fábio De. Mulheres cheias de graça, 2015, p.14).
           

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ORFANDADES - O destino das ausências.

É um livro que tem uma narrativa envolvente, Pe. Fábio com seu olhar poético sobre as ausências humanas, conta histórias de personagens e lugares atingidos pelos misteriosos territórios da solidão e do desamparo existencial.
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